Problemas do paíS
INDICE
O jogo eleitoral não foi inteiramente limpo nas legislativas de 4 de Outubro (aqui)
Manifesto em defesa da classe média (aqui)
Cortar os nós górdios que atam o país (aqui).
O jogo eleitoral NÃO FOI INTEIRAMENTE lIMPO
O país foi surpreendido com as negociações do PS com o PCP e BE, que terão
justificado o fracasso das negociações entre PS e PàF. Como disse o Dr.
Francisco Assis, estas negociações são contranatura, atendendo aos respetivos
programas, e foram sempre impossíveis, dados os princípios de PCP e BE contra a
UE, a NATO, o Euro e dada a ideologia extremada que estes partidos têm. Embora
bem inseridos na democracia, o marxismo que professam declarada ou veladamente,
traz sempre o risco de autocracia, em oposição frontal ao critério supremo
da liberdade que enforma o PS.
Tal arranjo não estava na perspetiva realista dos eleitores, não obstante a PàF
ter alertado para o risco dessa eventualidade. Apareceu como efetivo no jogo
eleitoral só depois de conhecidos os resultados, o que falseou o próprio jogo.
Verdade que o secretário-geral do PS afirmara sempre que não havia tabus à sua
esquerda; verdade que o BE levantara a hipótese de aceitar o programa do PS com
alterações consideradas linhas vermelhas; mas a atitude do PCP na campanha fora
a mesma de sempre, a de responsabilizar duramente o PS também pela austeridade.
Os eleitores não contavam agora com esta sua atitude completamente nova.
Num jogo democrático limpo, tudo deveria ter `estado em cima da mesa´ no ato
eleitoral. Devia ter-se podido ponderar que, só com maioria absoluta, a PàF
garantiria o Governo, pois ganhasse ou perdesse o PS, haveria sempre a hipótese
de ser este último a formar Governo com a sua esquerda mais radical. Muitos que
votaram PS na ideia de que assim forçariam a coligação a não ser tão soberba,
ter-se-ão sentido defraudados, se nunca aceitariam a união que se fez.
Moralmente, impunham-se novas eleições para o jogo ser mais transparente, como
agora se diz.
De facto, nada do que se passou é ilegal, mas a realidade é que o inesperado
ofende a ética do inconsciente coletivo, e este raramente perdoa, como já
sublinhámos. O PS está ele próprio a correr sérios riscos, infelizmente para o
seu papel fundamental na democracia portuguesa.
Depois, numa assinada declaração de ação conjunta (que está muito longe de ser
um acordo com incidência parlamentar garantido, dadas as divergências não
sanadas no que se refere à nossa relação com UE), o PS em conluio com o PCP e o
BE rejeitou o Governo que, segundo a tradição, tinha sido empossado por ter
ganho as eleições, e também na tradição do nosso regime de que nas legislativas
o povo escolhe o primeiro-ministro que na ocasião lhe merece mais confiança para
governar o país. Sublinha-se que no atual regime o povo não elege
individualmente os deputados, mas listas de partidos, e que é nelas que escolhe
o presumível primeiro-ministro.
Com a sua decisão, o PS excluiu a hipótese que tinha de ser um partido charneira
entre a sua esquerda e o Governo, para impor as mudanças convenientes; liquidou
qualquer consenso alargado possível; dividiu o país em duas frentes
completamente antagónicas e em perigosa guerra aberta (reparemos que no
resultado das eleições temos o centro para o norte praticamente todo laranja e
para o sul todo rosa...) e, em resumo, desagregou a paz nesse inconsciente
coletivo, atropelando os hábitos adquiridos em dezenas de anos.
Havia o sistema tácito de o Parlamento aceitar pacificamente maiorias relativas,
na condição de estas encontrarem consensos à esquerda e direita para poderem
permanecer. Os constituintes terão concluído, como se verificou de facto, que as
maiorias absolutas, num regime partidocrático, permitem a ditadura abusiva dos
partidos que estão dominantes no Parlamento (pois, controlando simultaneamente
executivo e legislativo, decidem olimpicamente, como se fossem donos do país).
Ou seja, as maiorias absolutas de partidos tendem, na sua ação, a confirmar a
ideia original em Locke de que as maiorias nem sempre têm razão. Ideia que
enformou o espírito das constituições depois estabelecidas, e de que o primeiro
exemplo foi a dos EUA em 1787.
Em Portugal, agora só podemos ter no futuro: e se com maioria absoluta, “a
tendência popular média: de alguma tolerância ao liberalismo, da
social-democracia moderada e do prémio do mérito”; e, do outro, também só com
maioria absoluta, “a tendência marxista do socialismo dito democrático: completa
recusa de qualquer liberalismo e com bandeira assistencialista acima de tudo,
mesmo que penalizando autocraticamente os mais capazes”. Ficou sem voz o centro
que quer consensos e aceita o que for bom nos dois lados.
Ou seja, deixou de existir o centro de equilíbrio que alguns dirigentes do PS
defendiam, e sempre fora o critério do partido socialista. O argumento agora do
PS foi de que o povo tinha dado maioria à esquerda (123 deputados contra 107),
mas esquece que a malfadada disciplina de voto deturpa a realidade. O resultado
poderia ter sido outro se o conjunto dos deputados tivesse votado segundo a sua
consciência e não feitos serventuários dos partidos (convertendo assim a
Assembleia da República não num Respeitado Fórum de representação do povo que o
elegeu, mas numa Câmara ao serviço dos partidos: a partidocracia).
Se os deputados
tivessem votado livremente, de certeza aquilo que o povo pretendeu ter-se-ia
conseguido e surgiria um equilíbrio propiciador de consensos, também à esquerda
nas suas justas queixas. Mas então sem as guerras que poderão dilacerar o país,
com elevados prejuízos na harmonia social. Não é aceitável pensar-se que houve
sobretudo da parte do PS a ambição do poder (PS e não só do seu
secretário-geral, pois foi quase unanimemente apoiado). Dir-se-á que foi o
pensar-se que assim seria mais fácil desfazer o que de mau foi feito pelo
anterior Governo. Só que propondo-se governar depois de ter desiludida e
manifestamente perdido nas eleições, o PS gravemente eliminou a possibilidade de
no futuro haver governos de minoria. De facto, mesmo que ganhe as eleições fica
sujeito a nem iniciar o Governo se houver também um movimento no Parlamento que
se oponha.
Por outro lado,
a elevada abstenção e os votos nulos nas legislativas de 2015 atingiram quase o
limite de recusa completa do povo sobre o regime (43,07 abstenções e 3,7 nulos).
O regime político português parece estar mesmo a ser mal aceite pelo povo.
Talvez a dificuldade de consensos, já prevista na campanha eleitoral, para um
plano de longo prazo, fosse uma das causas. Então, a solução depois escolhida
pelo PS ainda poderá ter agravado mais o sentimento de repulsa nesses
não-eleitores. O PS forçou uma mudança que se sente ser necessária, mas era só
essa que o povo queria ou outra mais significativa, de concórdia na salvação do
país e nos horizontes futuros? A verdade é que a PàF ganhou folgadamente as
eleições...
É nestas alturas de desconchavos que surge às vezes uma vontade forte, que põe
os superiores interesses do país acima de todas as coisas. Foram também
disparates destes que deram origem ao 28 de Maio, com os militares a invocarem a
sua honra de serviço à Pátria, para nos imporem uma ditadura e depois Salazar.
Há a certeza de que nos livraremos de tal levantamento agora, com o país em
ebulição, dividido ao meio?
E o que vai ser do regime se perdermos um PS de charneira que, desde a
impressionante coragem de Mário Soares na Fonte luminosa, o tem equilibrado? O
regime vai implodir, como há muito se receia, em vez de ser mudado
paulatinamente a bem? Dr. António Costa, como vai agora, por exemplo, conseguir
as mudanças exigindo dois terços, algumas que, com tanta visão de futuro, consta
defender?
D'
Silvas Filho